quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Terra dos Homens

"Não queres te inquietar com os grandes problemas, e fizeste um grande esforço para esquecer a tua condição de homem. Não és o habitante de um planeta errante, e não lanças perguntas sem solução: és um pequeno burguês de Toulouse. Ninguém te sacudiu pelos ombros quando ainda era tempo. Agora, a argila de que és feito já secou e endureceu, e nada mais poderá despertar em ti o músico adormecido, ou o poeta, ou o astrônomo que talvez te habitassem..."

Saint-Exupéry 

Com licença poética - Adelia Prado


Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.